Dear Lover - [Capítulo 3]

- Caetana, filha, chegamos. - A voz do meu pai arrancou-me dos pensamentos, fazendo-me encarar os seus olhos tão ou mais verdes que os meus outrora foram.
- Obrigada pai. Até logo.
- Queres que te venha buscar, né?
- Sim, se puderes.
- Claro que sim. Até logo. - Deixei-lhe um beijinho na barba mal coberta pela barba e saí do carro, acenando-lhe avidamente. Assim que o carro preto de luxo saiu do meu campo de visão, fiz todo o meu caminho até à sala que me iria receber para a primeira aula do dia de hoje.


*****


- Caetanaaaaaaaaaaaaaaaaaa! - Berrou Benedita, assim que se aproximou de mim.
- Ah porra Beny, era escusado!
- Andas sumida pá.
- Tenho ficado em casa dos meus pais ultimamente.

- Mas está tudo bem?
- Sim, só precisava de voltar ao ninho.
- Tens a certeza que é só isso? Eu conheço-te bem, Nana!
- Não me chames isso! Ninguém tem o direito!
- Porquê Caetana? Porque ele se foi sem te dizer algo? Tens de deixar isso para trás!
- Eu deixo se quiser, porra!
- Pronto, como queiras. Miúda mimada.
- Desculpa? Mimada só porque não quero tocar num assunto que ainda hoje me dói? Ele foi-se embora para bem dele, Benedita! Pelo futuro dele! Mas as memórias dele ficaram comigo e dessas só me esqueço se quiser. Por isso, se estás mal, a porta da rua é serventia da casa.

Estava tão revoltada que nem dei pelas lágrimas a correr pelas maçãs do rosto. Corri para a rua, rezando para que o meu pai já estivesse à porta da faculdade à minha espera.  Assim que avistei o carro negro de alta cilindrada, apressei-me para o alcançar. Abri a porta e atirei-me para dentro do veículo, deparando-me com a cara preocupada da minha mãe.
- Querida, está tudo bem?
- Está, mamã. O pai?
- Está em casa, à nossa espera.
- Vamos almoçar juntos?
- Sim, meu amor. A Anabela fez lasanha.
- VAMOS! - O meu muito repentino entusiasmo fez a minha mãe soltar uma pequena gargalhada. Levou a mão à minha face, afagando levemente o meu rosto. Depois ligou o carro e iniciou todo o percurso até casa.
- Tens a certeza que está tudo bem, Nana?
- Está sim. É só a Benedita que teima em tentar saber tudo o que se passa comigo.
- E?
- Ela chamou-me Nana, mãe. Só tu, o pai e o Rafa me podem chamar assim!
- E o Bernardo?
- O Bernardo…. é passado, acho eu?! - Atirei, tentando ao mesmo tempo convencer a minha mãe e, mais importante, eu.
- Meu amor, não te esforces para me enganar quando ambas sabemos que isso não é verdade!
- Mas devia ser!
- Caetana, filha, talvez deva, talvez não. Só o destino sabe. E se estiver destinado, um dia vocês voltam a encontrar-se. Mas um carinho como o vosso, não se vê muito hoje em dia.
- Se calhar tens razão, mamã.
- Oh, eu tenho razão! Mas já agora: o quê que despoletou as tuas memórias? - Bonito, estou tramada. Não posso dizer à minha mãe que me envolvi com um desconhecido.
- Hm, vi uma fotografia dele. De alguma maneira misturou-se com as minhas coisas quando me mudei para o meu apartamento e agora apareceu, sabe-se lá de onde.
- Tens a certeza? - insistiu, ao mesmo tempo que trespassamos os grandes portões cinzentos que separavam a mansão que pertencia aos meus pais do resto da rua.
- Sim mãe. - Atirei, enquanto abria a porta e corria para dentro de casa tentando de alguma maneira fugir à conversa. Entrei pela sala dentro, avistando o meu pai no sofá a trabalhar no que quer que fosse. - Olá papá!
- Vinhas a fugir de quê, Nana?
- Nada pai.
- Tens a certeza?
- Tenho.
- A tua mãe?
- Estou aqui, Henrique. Vamos almoçar então?
- Vamos!
- Eww arranjem um quarto. - Piquei, assim que observei a minha mãe baixar-se ao nível do meu pai para o beijar apaixonadamente, fazendo-os rir alto demais.

Dirigimo-nos para a mesa - eu um algo mais rápido que eles - levando o meu pai a sorrir ternamente. Durante o almoço, todo um silêncio imperou entre nós mas não era de nada estranho. Muito pelo contrário, era reconfortante porque estava de facto cheio de amor. De amor entre os meus progenitores e deles para mim. Sempre - desde pequenina, quando ainda não tinha trocado os vestidos por jeans e quando ainda segurava o meu pequeno urso de peluche ao peito sempre que tinha medo e não conseguia dormir - que eles eram o meu exemplo. Um exemplo de amor, de carinho. De respeito mútuo, principalmente. Mesmo quando o Bernardo ainda fazia parte da minha vida diária, cheguei a olhá-lo discretamente enquanto desejava que fosse para mim como o meu pai era para a minha mãe.

- Mulheres da minha vida. - Atirou o meu pai. Coisa boa não se adivinhava.
- Papá, o que é que vem daí?
- Conheces-me tão bem, Nana. Bem, lembram-se do Paulo e da Maria, certo?
- Paulo e Maria como pais do Bernardo, certo? - Assim que o vi assentir, uma sensação de melancolia voltou a invadir-me. - Claro que me lembro. Que tem eles?
- Convidaram-nos para jantar com eles, no próximo sábado.
- Aceitaste pai?
- Claro que aceitei. Espero que não te importes.
- Claro que não me importo. Continuo a adorar o tio Paulo e a tia Maria. E eles sempre me pediram para não me afastar deles. Mas foi exatamente o contrário que eu fiz, comecei a reduzir o contacto só pelo simples facto deles serem os pais do meu melhor amigo. Ugh, eu não valho nada. - A este ponto, as lágrimas já me corriam pela face, pela terceira vez neste mesmo dia. Os meus pais apressaram-se a envolver-me num abraço forte, enquanto os meus soluços se iam intensificando.
- Caetana, meu amor. Nunca mais digas isso. Nunca mais digas que não vales nada! É completamente compreensível que tenhas feito isso. As saudades conseguem ser cruéis, eu sei. Mas nós estamos aqui contigo, prontos para te segurar se algo correr mal e te atirar para o chão. - Disse a minha mãe, muito sabiamente. Estava infinitamente agradecida por tê-los na minha vida.
- Dão-me licença para que me levante da mesa?
- Onde vais?
- Para o quarto. Preciso de descansar. Desculpem.
- Não te preocupes. Vai lá. Eu vou estar no escritório caso precises de algo.
- Está bem papá.



Sábado, 18 de Fevereiro de 2017

Tentava arranjar-me tão bem quanto o meu corrente estado de nervos me permitia. Olhei-me ao espelho, ajeitando o cabelo loiro liso. Maquilhagem? Nada demais mas o suficiente para destacar os meus olhos claros. O vestido preto, de mangas rendadas e saiote a bater pelo joelho, delineava as curvas que agora tinham tudo de mulher e nada de criança. Calcei os meus scarpins nude, agarrei no meu blazer da mesma cor e na minha pequena pochete e saí do quarto, dirigindo-me ao hall de entrada onde os meus pais já me aguardavam.
- Meu amor, estás tão linda!
- Obrigada mãe. Vamos?
- Vamos.

Deu a mão ao meu pai e juntos fizeram todo o caminho até ao carro usualmente designado para a minha mãe. Enquanto o meu pai abria a porta à minha mãe, eu apressei o passo até à porta traseira do carro de luxo cinzento. Em poucos minutos estávamos a caminho e eu não podia evitar mas sentir-me sufocada nos meus próprios pensamentos. Como será que eles iriam reagir? Bem? Será que iriam compreender o porquê do meu afastamento? E mais importante: será que o Bernardo, o meu Berna, também iria? Paramos em frente ao restaurante do costume e aí eu apercebi-me de que estava a suster a respiração. À entrada do Cantinho do Geraldes - um dos meus restaurantes de eleição - estava uma jovem morena, cuja cara não me era estranha. Assim que o meu pai estacionou o carro, abandonamos o mesmo e, muito lentamente, começamos a dirigir-nos para a porta do estabelecimento.
- Tio Henrique, Tia Carlota! - Falou a jovem morena.
- Maria, minha querida! - Respondeu a minha mãe, enquanto envolvia a outra mulher num carinhoso abraço. - Esta é a Cae...
- Nana! Oh meu Deus, tu estás tão diferente miúda! Estás loira, muito loira. E o que é feito das tuas … sardas? - O sorriso dela desapareceu, para dar lugar a uma cara de espanto.
- Está tudo bem, Maria?
- Está sim, não te preocupes. É só que já lá vai algum tempo e tu mudaste tanto. Da última vez que te vi ainda tinhas cabelo tão ou mais ruivo que o Ed Sheeran.



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